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As Lições da Bolívia: o proletariado na situação pré-revolucionária

category bolivia / peru / ecuador / chile | workplace struggles | opinião / análise author Friday June 17, 2005 09:52author by UNIPA - UNIPA/Brasilauthor email unipa_net at yahoo dot com dot br Report this post to the editors

Comunicado da União Popular Anarquista UNIPA # n º08 – Rio de Janeiro, Junho de 2005

“Ao bravo povo boliviano;
Aos militantes dos movimentos sociais brasileiro e latino-americanos.
Aos companheiros revolucionários em todo o mundo.”

A crise política iniciada em maio de 2005 na Bolívia se encaminhou no sentido da formação de uma situação pré-revolucionária. As mobilizações populares massivas culminaram com o cerco da capital La Paz pelo movimento de massas, com o bloqueio das principais estradas do país (paralisado à circulação de mercadorias e a economia do pais) e renúncia do presidente Carlos Mesa; depois com ataques ao Congresso Nacional do País, durante o impasse gerado pela sucessão presidencial.
Uma análise teórica de mais uma crise política na Bolívia é necessária. Esta crise política na Bolívia se apresenta dentro de um ciclo de crises provocadas pelo ajuste dos paises latino-americanos aos regimes econômicos liberais, impostos pelo imperialismo internacional. O caso da Bolívia serve para dar duas lições importantes ao proletariado internacional: 1º) a primeira lição que o povo boliviano nos ensina é o da possibilidade de resistência popular as reformas liberais e reversão de certas medidas desfavoráveis ao povo, impostas pelas forças burguesas e suas aliadas, através da ação direta de massas, das greves e lutas de rua; 2º) a segunda, diz respeito as limitações que um movimento de massas sem uma direção revolucionária guiadas por uma teoria e um programa claros e bem definidos.
O povo boliviano demonstra ser um povo guerreiro, com profunda disposição para a luta. Sua luta tem sido tão intensa que vem provocando sucessivas crises política no país, primeiramente a que levou a renuncia do então presidente Gonzalo Sánchez de Lozada em 2003 e agora “Guerra do Gás”. Por outro lado, e contraditoriamente, apesar da força do movimento de massas, da pressão que política que exerce, este movimento não evoluiu, num primeiro momento, numa direção revolucionária. E isto é extremamente grave, porque a lógica do sistema capitalista indica que a repressão é uma variação proporcional a mobilização popular, o que significa que conforme a mobilização de massas cresça, a repressão se ampliará, de maneira a culminar em uma Ditadura, que teria a missão de destruir os focos de organização popular.
Neste sentido, é preciso fugir das meras saudações alusivas e analisar a crise na Bolívia de um ponto de vista materialista. Indicar quais as possibilidades e debilidades do movimento de massas diante da atual crise política. È isto que faremos a partir do método materialista bakuninista.

1- Caracterização da Situação e das Alternativas na Bolívia.

Primeiramente, devemos caracterizar a situação social em que a Bolívia entre meados de maio e o dia 10/06/2005, quando a crise pareceu tomar uma definição. Podemos dizer que a Bolívia vive uma situação pré-revolucionária. Isto porque: 1) existe uma grande mobilização popular; 2) a economia do país se encontra paralisada devido a tal mobilização; 3) se abriu uma crise política que levou a renuncia do presidente e a um vácuo de poder; 4) choques diretos e constantes do movimento de massas com os aparelhos repressivos de Estado, polícia e exército.
O atual momento é uma situação pré-revolucionária e não uma situação revolucionária. Isto porque, até agora o povo ainda não está em armas. Esta é a única condição objetiva que falta para a formação de uma situação revolucionária. As condições subjetivas foram dadas pelo trabalho político de mais de 10 anos dos diferentes movimentos organizados de trabalhadores. O movimento de massas poderia precipitar por sua ação, a formação da situação revolucionária (com a tomada de quartéis, por exemplo).
Caso este fator venha a se somar aos demais, uma situação revolucionária estará dada. E aí a responsabilidade pela vitória ou derrota do proletariado boliviano estará nas mãos dos Partidos e Movimentos Sociais organizados. E somente uma ação política orientada por uma teoria e um programa poderão levar à vitória do povo.
Neste momento, podemos dizer que duas alternativas formuladas pelos movimentos de oposição ao Governo Carlos Mesa e ao Regime Liberal se apresentam ante o povo boliviano e a história. Uma é a via reformista e democrático-burguesa, representada pelos movimentos organizados em torno,principalmente, do MAS de Evo Morales. Outra seria a via revolucionária, virtualmente possível, mas que não poderíamos indicar a existência de forças capazes de garanti-las na Bolívia hoje. Este é um enigma.
A via reformista aponta como solução a convocação de novas Eleições e de uma Assembléia Constituinte. Este é o repertório clássico das oposições democrático-burguesas. Diante de uma situação pré-revolucionária, fica nítida a função conservadora da proposta reformista que irá desviar as massas do rumo da tomada do poder.
A via revolucionária indicaria três soluções: 1) a insurreição geral (modelo da revolução russa de 1917); 2) a guerra popular prolongada (modelo da revolução chinesa e em parte também da revolução vietnamita); 3) a guerra de guerrilhas de curta duração (modelo cubano e em parte, o argelino). O problema é que nem toda situação revolucionária evolui no sentido da revolução, ela pode retroagir para compromissos inter-classes ou mesmo ser dissolvida pela ditadura ou outra forma de repressão burguesa.
Para que a via revolucionária se consolide, é preciso três condições básicas: 1) a existência de um Partido Revolucionário ou pelo menos de uma Frente Revolucionária (como ensina o caso da Argélia) de atuação nacional, que garanta uma estratégia e direção unificada de luta e a militarização do movimento popular no momento correto; 2) a existência de um Movimento de Massas forte, influenciado por tal partido ou frente; 3) a formulação de um Programa, que possibilite a aglutinação das maiorias das massas para o assalto ao Poder.
É preciso saber se tais condições existem na Bolívia hoje. E caso não existam, aí estarão provavelmente as razões dos impasses que o proletariado boliviano irá enfrentar. O movimento de massas, que a esquerda mundial deve saudar com entusiasmo, logo estará diante deste impasse. Será preciso lançar uma ofensiva revolucionária, mas existirão condições para tal?. Se existirem condições, o caminho preferencial será o da insurreição geral e se esta fracassar restará a guerra popular prolongada. Mas ao que parece tais condições não existem. Um dos principais líderes da oposição, Evo Morales, do MAS (Movimento ao Socialismo), tem uma orientação programática reformista. Assim como importantes organizações populares assinaram o “Pacto de Unidade”, documento em favor da Assembléia Constituinte. Se aceitou desmobilizar o povo com acordo que garantiu a posse de Eduardo Rodríguez, presidente da Corte Suprema de Justiça, que irá convocar eleições gerais. A via seguida por setores importantes do movimento de massas é a via reformista.
Por outro lado não se pode sentar apaticamente afirmando não ser possível fazer nada ou apoiar a via reformista democrático-burguesa. Uma revolução não se faz de improviso, mas também não leva o mesmo tempo para ser preparada que os diamantes levam para se formar. A classe trabalhadora e as organizações revolucionárias podem criar pela sua ação consciente e organizada as condições necessárias à revolução.
Sem as condições indicadas acima, uma Insurreição Geral na Bolívia teria poucas chances de sucesso. A Guerra Popular Prolongada, que exigiria a prévia formação de um exército popular, não se mostraria também viável. Resta então a possibilidade de uma Guerra de Guerrilhas de Curta Duração, que poderia evoluir para uma insurreição geral ou para a guerra popular prolongada ou para uma forma combinada das três.
A guerra de guerrilhas seria a alternativa mais viável nestas circunstancias por dois fatores: 1) o caráter predominantemente camponês do movimento boliviano; 2) o baixo grau de desenvolvimento militar necessário para tal; 3) o desgaste e desorganização do Estado boliviano. Assim, a melhor alternativa dentro da via revolucionária seria o “modelo cubano”, em que a revolução se produziu pela combinação da guerra de guerrilhas de curta duração com as ações de massas.
Este modelo exigirá a tomada de uma série de medidas: 1º) formação de um partido e/ou frente revolucionária; 2º) aplicação de uma política formação de quadros políticos e de gestores econômicos; 3º) formação de um organismo militar clandestino nas cidades; 4º) formação de grupos de auto-defesa populares; 5º) formação de bases clandestinas no campo, que servirão como focos guerrilheiros e embriões do exercito popular; 6º) criação de uma Rede Internacional de Solidariedade (busca de apoio de movimentos populares na AMÉRICA Latina, especialmente na Colômbia, Venezuela e Equador); 7º) estabelecer o controle operário-camponês, como alternativa a mera “nacionalização”; 8º) formação das Comunas-Sovietes como organismos de coordenação das lutas e atividades de produção-circulação que estiverem sob controle proletário, que se transformarão depois nas unidades territoriais de base do poder popular. .
Estas medidas visam à formação de um duplo poder na Bolívia: o poder das organizações operárias e camponesas existindo em relação de tensão permanente com o poder de Estado. Visam também ganhar tempo sem perder espaço, para que o proletariado militante possa organizar suas forças políticas e militares. Seria uma forma de tentar extrair o máximo da atual situação pré-revolucionária vivenciada pela Bolívia, sem incorrer em precipitações que podem levar a derrota. Esta é a solução mais realista (segundo o nosso entendimento), sendo pautada na análise da experiência histórica concreta e nos dados disponíveis sobre a situação boliviana hoje. Qualquer país que se encontre numa situação similar à da Bolívia se defrontaria com os mesmos impasses e alternativas.
Devemos fugir das analises românticas e voluntaristas. A vitória da revolução boliviana depende de uma correta estratégia. Mas falta ainda compreender como e por que apesar da formação de uma situação pré-revolucionária, da força dos movimentos populares, a revolução pode ser derrotada. Para isso, é preciso analisar a evolução do movimento proletário, dos partidos políticos e suas principais idéias e estratégias.

2- Ensinamentos da Bolívia para a Revolução Brasileira e Latino-americana.

O que a Bolívia já ensinou, e ainda ensinará para o proletariado brasileiro e latino-americano, é exatamente o grau da força em que o movimento popular pode alcançar sem apontar necessariamente para a ruptura revolucionária. Neste sentido, podemos dizer que caso a situação na Bolívia evolua para uma guerra civil ou seja contornada por acordos, ela nos dá as seguintes lições (que serão discutidas com maior profundidade teórica em outras ocasiões):

- é preciso que o movimento de massas produza formas de consciência e organização revolucionárias, que tenham uma teoria e um programa, e que garantirão a direção revolucionária e a militarização do movimento de massas no momento de eclosão das situações pré-revolucionarias. Como afirmou Bakunin, “é necessária a existência de uma organização que garanta a direção revolucionária ao proletariado por uma preparação prolongada”. A existência de uma organização revolucionária baseada na unidade teórica, tática, responsabilidade coletiva e federalismo é fundamental ao processo revolucionário, assim como a constituição de um exército revolucionário.
- caso esta pré-condição não se verifique, o proletariado será imobilizado pelas suas próprias contradições e capitulará ou será derrotado pela repressão da burguesia. A revolução é a guerra, e somente pela guerra é possível destruir o poder burguês. A burguesia sabe disso. A solução contra a guerra revolucionaria é a ditadura. No sistema capitalista, a ampliação da quantidade e qualidade da organização das massas tem como contra-partida o aumento da organização burguesa. Conforme aumente polarização social em torno de reivindicações materiais (como acontece na Bolívia com relação ao controle do Gás), a solução final sobre os conflitos de classes somente será dado pela violência. A tendência então é que a ditadura seja a solução encontrada pela burguesia, mesmo que uma “ditadura constitucional”, ditadura disfarçada sob mecanismos democráticos, como já testemunhamos na América Latina. Quando o movimento de massas enfrenta uma situação pré-revolucionária, se ele não dispuser de organizações revolucionarias preparadas para tal, a burguesia terá tempo de reagrupar suas forças e lançar uma ofensiva para destruir o movimento de massas. É isso que a burguesia boliviana tenta fazer ao reunir o Congresso Nacional em Sucre, e ao deslocar tropas do exército para a capital do país, La Paz, e fazer acordos para garantir eleições, ao mesmo tempo em que Vaca Diéz, do MIR, tenta articular saída “militares”. Os acordos dão tempo para o Estado boliviano se reorganizar e desarticular o movimento popular pela repressão e cooptação.

- uma outra lição, é a que mostra o potencial revolucionário do campesinato e a importância das contradições étnicas para a luta de classes. A crise econômica da Bolívia está diretamente ligada à desigualdade social entre uma massa de camponeses indígenas e uma burguesia criolla que controla a agroindústria. Na atual etapa do capitalismo mundial, a América Latina ocupa um lugar periférico na divisão internacional do trabalho, uma posição fundamentalmente agrário-exportadora, como é o caso da Bolívia. As contradições econômicas entre burguesia rural e campesinato e proletariado rural ganham dimensão estratégica. O caso da Bolívia indica que as nossas análises contida no documento “A Revolução Social no Brasil” (2004), e “As Reformas do Governo Lula e a Tarefas do Proletariado” (2005), pelo menos ainda na atual conjuntura, estão corretas.

A atual situação da Bolívia merece a atenção do proletariado internacional. Devemos apoiar, mas também interpretar teórica e criticamente todos os passos dos movimentos de massas. Esta crise na Bolívia oferece lições importantes para a revolução brasileira. Também serve para mostrar a função da teoria bakuninista na elucidação dos principais problemas da revolução.

Classe Trabalhadora – Nem um Passo Atrás ! O Povo Vencerá !

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