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A Estratégia de Transformaçao Social em Malatesta

category brazil/guyana/suriname/fguiana | movimento anarquista | opinião / análise author Friday October 16, 2009 23:41author by Felipe Corrêa - FARJ Report this post to the editors

Artigo que trata da proposta de Errico Malatesta para a transformação social.
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A ESTRATÉGIA DE TRANSFORMAÇAO SOCIAL EM MALATESTA

Felipe Corrêa


A proposta de transformação social em Malatesta tem como guia o anarquismo. Sendo este entendido pelo italiano não como sistema filosófico, mas como ideologia, possuindo então o objetivo transformar a realidade do sistema capitalista e estatista em socialismo libertário, ou como ele se referia, em “anarquia”, sendo ela entendida como “sociedade organizada sem autoridade”. Dessa maneira, o “anarquismo é o método para realizar a anarquia”.[1]

Assim compreendido, o anarquismo de Malatesta é voluntarista, ou seja, não se baseia na concepção de que o socialismo, ou mesmo a anarquia, é inevitável, ou uma conseqüência obrigatória do desenvolvimento da sociedade. Baseia-se, ao invés disso, na concepção de que só a vontade organizada do povo é capaz de produzir a transformação social necessária, realizando a revolução social e abrindo caminho ao socialismo com liberdade.

Para Malatesta, o socialismo é um sistema em que “ninguém possa explorar o trabalho de outrem, graças à monopolização dos meios de produção; que ninguém possa impor sua própria vontade a outros por meio da força bruta ou, o que é pior, graças à monopolização do poder político”.[2] A liberdade, ou “liberdade social” é a “igual liberdade para todos, e uma igualdade de condições que possa permitir a todos e a cada um agir como bem entende, tendo, como único limite, o que impõem as necessidades naturais inelutáveis e a igual liberdade de todos”.[3]

Malatesta, para a realização desta transformação, concebeu uma certa estratégia que buscava encontrar os meios necessários para que chegasse ao fim desejado. Tratou, insistentemente, da questão da organização, polemizando com anarquistas individualistas e anti-organizacionistas, argumentando que “permanecer isolado, agindo ou querendo agir cada um por sua conta, sem se entender com os outros, sem preparar-se, sem enfeixar as fracas forças dos isolados, significa condenar-se à fraqueza, desperdiçar sua energia em pequenos atos ineficazes, perder rapidamente a fé no objetivo e cair na completa inação”[4] Para ele, o remédio contra a exploração, e mesmo contra o isolamento, é a organização.

Concebida como “coordenação de forças com um objetivo comum, e obrigação de não promover ações contrárias a este objetivo”[5] a organização é a única forma de articular o povo, transformando a força que nele está latente em força real. Com organização, pode haver aumento progressivo desta força social, oferecendo a possibilidade de imprimir à sociedade tal transformação social desejada.

Desta forma, a organização é pensada em quatro perspectivas “a organização em geral, como o princípio e condição da vida social, hoje, e na sociedade futura; a organização do partido anarquista e a organização das forças populares.”[6] A organização do sistema atual, ou seja, o ponto de partida, a organização da sociedade futura, ou seja, o ponto de chegada. Neste esquema estratégico, entram a organização das forças populares e do próprio anarquismo como meios de se sair de onde está para se chegar onde se deseja.

Para tanto, Malatesta propôs um modelo de organização anarquista que fosse concebida como “o conjunto dos indivíduos que têm um objetivo em comum e se esforçam para alcançá-lo, é natural que se entendam, unam suas forças, compartilhem o trabalho e tomem todas as medidas adequadas para desempenhar esta tarefa”[7]. Organização esta, que trabalha com certa disciplina, entendida como “a coerência com as idéias aceitas, a fidelidade aos compromissos assumidos, é se sentir obrigado a partilhar o trabalho e os riscos com os companheiros de luta”[8]. Esta organização está articulada no âmbito político e ideológico e tem como objetivo a aplicação de uma política revolucionária nos movimentos populares, que são fruto da luta de classes, garantindo que seus meios de luta apontem para os fins desejados.

Para tanto, segundo o italiano, a organização anarquista deve buscar inteiração com estes movimentos populares, que na sua época eram mais claramente identificados nos sindicatos. Este âmbito social – constituído pelos movimentos sociais ou “movimentos de massa”, como eram conhecidos – se devidamente organizado, pode promover a revolução social. Apesar disso, recomendava Malatesta que estes movimentos não devem ser “ideologizados” pelos anarquistas – ele não defendia, por exemplo, sindicatos anarquistas – mas sim, serem o espaço privilegiado de propaganda ideológica do anarquismo. Portanto, uma inteiração entre a organização anarquista e os movimentos populares não anarquistas seria inevitável.

A partir desta inteiração, escreveu Malatesta, “queremos agir sobre ela [a massa] e impeli-la ao caminho que acreditamos ser o melhor, mas como nosso objetivo é libertar e não dominar, queremos habituá-la à livre iniciativa e à livre ação”.[9] Considerando a organização anarquista uma organização de minoria ativa, que atua no seio dos movimentos populares de forma antiautoritária, Malatesta defende sua posição:

"Não queremos ‘esperar que as massas se tornem anarquistas’ para fazer a revolução; tanto mais de que estamos convencidos de que elas nunca se o tornarão se inicialmente não derrubarmos, pela violência, as instituições que as mantêm em escravidão. Como precisamos do concurso das massas para constituir uma força material suficiente, e para alcançar o nosso objetivo específico que é a mudança radical do organismo social graças à ação direta das massas, devemos nos aproximar delas, aceitá-las como elas são e, como parte das massas, fazê-las ir o mais longe possível. Isso, se quisermos, evidentemente, trabalhar de fato para realizar, na prática, nossos ideais, e não nos contentar em pregar no deserto, para a simples satisfação de nosso orgulho intelectual."[10]

Portanto, desta forma, é inevitável um confronto do anarquismo, manifesto por meio da organização anarquista, com a realidade da luta de classes, onde estão pessoas de ideologias diferentes. Assim, este “anarquismo social” de Malatesta, longe de fechar-se em si mesmo, amplia-se, buscando influenciar os movimentos e lutas sociais o quanto for possível, por meio da propaganda, fazendo com que funcionem “da maneira mais libertária possível”. Isto significa, na prática, influenciá-los às práticas classistas, combativas, autônomas, de ação direta e democracia direta.

Nesta inteiração do âmbito político com o social, Malatesta recomendava aos anarquistas não confundirem os meios (os movimentos populares) com os fins (o socialismo libertário). Dizia ele que “o movimento operário não é mais do que um meio – embora não há dúvida de que é o melhor meio de que dispomos. Mas eu me recuso a aceitar esse meio como um fim.”[11] Os anarquistas devem, portanto, “seguir sendo anarquistas manter-se sempre em entendimento com os anarquistas e lembrar que a organização operária não é um fim, mas simplesmente um dos meios, por importante que seja, para preparar o advento da anarquia”[12]. Por este motivo, parte do trabalho da organização anarquista, quando em contato com os movimentos populares, é defender uma visão de longo prazo, ou seja, um projeto político revolucionário que faça do movimento um meio para a sociedade futura e não um fim em si mesmo. No entanto, este meio constituído movimentos em luta, ao invés de buscar somente um fim distante, do socialismo libertário, é também responsável pela mobilização que deve conquistar e promover a melhoria das vidas do povo. Assim, são incitados “os trabalhadores a querer impor todas as melhorias possíveis e impossíveis, e é por isso que gostaríamos que eles não se resignassem a viver em más condições hoje, esperando o paraíso futuro”.[13] Para que estas conquistas aconteçam, Malatesta recomenda:

"é preciso arrancar do governo e dos capitalistas todas as melhorias de ordem política e econômica que podem tornar menos difíceis para nós as condições da luta e aumentar o número daqueles que lutam conscientemente. É preciso, portanto, arrancá-las por meios que não impliquem o reconhecimento da ordem atual e que preparem o caminho ao futuro."[14]

A luta de classes, expressa na luta dos movimentos populares, pode então melhorar imediatamente a vida daqueles que estão em luta, mas também pode ser a força que aponta para a revolução social.

Malatesta colocava ser impossível a separação da revolução social e da violência. Enfatizava, que esta revolução, “conduzida como a concebem os anarquistas, é a menos violenta possível; ela procura interromper toda violência tão logo cesse a necessidade de opor a força material à força material do governo e da burguesia”[15]. Tão logo o funcionamento do socialismo libertário esteja garantido, a violência deverá ser interrompida. Continua Malatesta sobre a violência, enfatizando:

"Os anarquistas só admitem a violência como legítima defesa; se hoje eles são a favor da violência é porque consideram que os escravos estão sempre em estado de legítima defesa. Mas o ideal dos anarquistas é uma sociedade na qual o fator violência terá desaparecido completamente e este ideal serve para frear, corrigir e destruir este espírito de violência que a revolução, como ato material, teria a tendência a desenvolver."[16]

Grande parte dos escritos de Malatesta busca ainda advertir para os meios equivocados de se buscar a transformação social. Em especial, como foi muito colocado por toda tradição clássica anarquista, a incapacidade de o Estado ser um meio adequado para a transformação social, posição defendida pela escola autoritária do socialismo durante toda a história. Independente se a “conquista” do Estado é feita pela revolução ou por meios reformistas, o fato é que Malatesta também defendeu, assim como Bakunin no seio da AIT, que a partir do momento que se conquista o Estado, aqueles que querem ser protagonistas da transformação, terminam como uma nova classe de exploradores. Em relação aos revolucionários, Malatesta fez críticas à concepção autoritária de socialismo, que considera o Estado e a ditadura como meios de se chegar ao comunismo. Para Malatesta, a posição dos comunistas autoritários sustenta “a ditadura de um partido, ou melhor, dos chefes de um partido; é uma ditadura verdadeira, no sentido próprio do termo, com seus decretos, suas sanções penais, seus agentes de execução e, sobretudo, sua força armada”.[17]

Em relação à estratégia eleitoral dos socialistas reformistas, colocou que “somos firmemente contrários a toda participação nas lutas eleitorais e a toda colaboração com a classe dominante; queremos aprofundar o abismo que separa o proletariado do patronato e tornar a luta de classes cada vez mais aguda”[18]. Os reformistas, quando se propuseram à conquista do poder político do Estado pelas eleições, “não podiam senão moderar cada vez mais seu programa, pôr-se a estabelecer relações de colaboração mais ou menos disfarçada com as classes burguesas, procurar amigos e proteção nas esferas governamentais, sufocar o espírito revolucionário que despertavam nas massas”.[19]

Assim, por meio da discussão dos meios adequados e não adequados para a transformação social desejada pelos anarquistas, Malatesta defende a máxima libertária, da coerência entre fins e meios, quando escreve que “os fins e os meios estão intimamente ligados, sem dúvida nenhuma, se bem que a cada fim corresponde, de preferência, tal meio, ao invés de tal outro; assim, também, todo meio tende a realizar o fim que lhe é natural, inclusive fora da vontade daqueles que empregam este meio, e contra ela”.[20]

Nada mais atual, se observarmos com cuidado a história.


Notas::

1. Errico Malatesta. “Anarquismo y Anarquia”. Excerto de Pensiero e Volontà, 1 de setembro de 1925. In: Vernon Richards. Malatesta: pensamiento y acción revolucionarios. Buenos Aires: Anarres, 2007 p. 21.
2. Idem. “Socialismo e Anarquia”. In: Anarquistas, Socialistas e Comunistas. São Paulo: Cortez, 1989 p. 7.
3. Idem. “Enquanto Isso...”. In: Anarquistas, Socialistas e Comunistas p. 101.
4. Idem. “A Organização II”. In: Escritos Revolucionários. São Paulo, Imaginário, 2000 p. 55.
5. Ibidem. p. 59-60.
6. Idem. “A Organização I”. In: Escritos Revolucionários p. 49.
7. Idem. “A Organização II”. In: Escritos Revolucionários p. 55.
8. Idem. “Ação e Disciplina”. In: Anarquistas, Socialistas e Comunistas p. 24.
9. Idem. “Enfim! O que é a ‘Ditadura do Proletariado’”. In: Anarquistas, Socialistas e Comunistas p. 87.
10. Idem. “A Propósito da Revolução”. In: Anarquistas, Socialistas e Comunistas p. 55.
11. Idem. “Sindicalismo: A Crítica de um Anarquista”. In: George Woodcock (org). Os Grandes Escritos Anarquistas. Porto Alegre: LP&M, 1998 p. 208.
12. Idem. “Los Anarquistas y los Movimientos Obreros”. Excerto de Pensiero e Volontà, 16 de abril de 1925. In: Vernon Richards. Malatesta: pensamiento y acción revolucionarios p. 122.
13. Idem. “Quanto Pior Estiver, Melhor Será”. In: Anarquistas, Socialistas e Comunistas p. 67.
14. Idem. “‘Idealismo’ e ‘Materialismo’”. In: Anarquistas, Socialistas e Comunistas p. 141.
15. Idem. “Uma Vez Mais sobre Anarquismo e Comunismo”. In: Anarquistas, Socialistas e Comunistas p. 70.
16. Ibidem.
17. Idem. “Carta a Luigi Fabbri sobre a ‘Ditadura do Proletariado’”. In: Anarquistas, Socialistas e Comunistas p. 60.
18. Idem. “Os Anarquistas e os Socialistas – Afinidades e Oposições”. In: Anarquistas, Socialistas e Comunistas p. 32.
19. Idem. “No Campo Socialista”. In: Anarquistas, Socialistas e Comunistas p. 45.
20. Idem. “Socialismo e Anarquia”. In: Anarquistas, Socialistas e Comunistas p. 6.


Junho de 2008


author by Khaledpublication date Tue Oct 20, 2009 21:54author address author phone Report this post to the editors

Este texto é uma excelente síntese das idéias-base do grandioso Malatesta. Iniciativa mais do que importante nesses tempos de retomada do anarquismo comprometido com a transformação social e a revolução.

Parabéns Felipe, por mais este ótimo trabalho!

Related Link: http://passapalavra.info
author by Carlospublication date Fri Oct 30, 2009 12:28author address author phone Report this post to the editors

Felipe, porque você não analisou a polêmica entre Malatesta e os "plataformistas" sobre a questão da organização anarquista?

Apesar dos pontos positivos, em tentar esclarecer o pensamento de Malatesta, seu texto peca em não dá a devida importância a essa questão. Acho essa uma questão importante para entender o pensamento de Malatesta, pois aponta para uma discussão que vai para além da necessidade de organização, e discute que tipo de organização, que modelo organizacional devem adotar os anarquistas.

A polêmica Malatesta x Makhno não pode ser ignorada, não podemos ignorar esse debate histórico, pois corremos o risco de cair em uma falsificação histórica dos debates acerca da questão organizacional no anarquismo. Esse debate é bastante esclarecedor das posições de ambos sobre qual deve ser o modelo de organização dos anarquistas. Retomando por tabela o debate Plataforma x Síntese. Fica aqui uma questão para pensarmos: é sabido que Malatesta discorda da Plataforma, então, onde ele se posiciona no debate Plataforma x Síntese. Seria no lado da Síntese? Ou numa "terceira via" nunca esclarecida em lugar algum?

Aguardo a resposta.

author by Felipe C.publication date Mon Nov 02, 2009 23:37author address author phone Report this post to the editors

Caro Carlos, eu não analisei este episódio assim como não analisei nenhum outro debate dele em especial (com os antiorganizacionistas, individualistas, sindicalistas etc.), mas sim tentei, a partir de referências diversas, expor a lógica de sua estratégia de transformação.

Minha intenção com este artigo é iniciar um raciocínio de que que existem similaridades entre a concepção estratégica de Malatesta e a Plataforma - tema que pretendo desenvolver mais a frente em outros artigos. Tanto isso é verdade que a Federação Anarquista Uruguaia, por exemplo, concebeu toda a sua base estratégica sobre o pensamento de Malatesta (em recente entrevista que fiz com o J. C. Mechoso ele expõe isso muito claramente) e historicamente ela se apresentou de maneira muito similiar à Plataforma, que chegou ao conhecimento dos uruguaios muito depois - inclusive na participação armada que tiveram durante a ditadura.

Acredito que algumas posições de Malatesta - especialmente às do final do século XIX, em torno da reflexão do partido anarquista - trazem elementos importantes da estratégia bakuninista (que para mim é a base da Plataforma). Agora não estou falando que uma coisa é a mesma que a outra. Não há dúvidas que a experiência da Revolução Russa permitiu ao "Grupo dos Anarquistas Russos no Estrangeiro" que pudessem aperfeiçoar o modelo de organização e que isso significasse um "salto qualitativo" em termos de modelo organizacional em relação à Bakunin e Malatesta.

Em relação à "discordância" de Malatesta em relação à Plataforma, algumas coisas devem ser colocadas. Primeiro, suas condições na época (prisão domiciliar, ficando sabendo das notícias por outros e não por ele mesmo), o que facilitou, ao meu ver, a atmosfera de mal-entendido. Ou seja, ele viu a discussão da Plataforma pelos olhos dos outros e não pelo seu próprio. Segundo, a tradução de Volin da Plataforma que, realizada de maneira bastante "parcial" contribuiu com toda a discordância que se deu em torno dela. Para isso, cito o Skirda, tradutor dos documentos de Dielo Truda do russo:

"Lembremos que a primeira tradução efetuada por Volin fora contestada por ser 'ruim e pesada', o tradutor não tendo 'tomado cuidado de adaptar a terminologia, as frases ao espírito do movimento francês' . Procuramos saber a que podiam aplicar-se essas censuras e encontramos, com efeito, vários termos conscientemente deformados: napravlenie, que significa tanto 'direção' como 'orientação', foi sistematicamente empregado no primeiro sentido; idem para o verbo rukovodsvto, significando 'conduta', e o verbo que nele originou-se, 'guiar, conduzir, dirigir, administrar', foi também sistematicamente traduzido por 'dirigir'. O caso é ainda mais flagrante na última frase da Plataforma, zastrelchtchik, significando 'instigador'; foi traduzido por 'vanguarda'. Foi assim que, por leves pinceladas, o sentido profundo do texto pôde ser alterado. Tudo isso é desagradável pois o tradutor, Volin, foi, em seguida, o principal detrator da Plataforma."

Finalmente, se observarmos com cuidado a dicussão toda entre Makhno, Arshinov e Malatesta, veremos que ao final, com todos os esclarecimentos feitos, Malatesta aceita muito mais a Plataforma do que em seu primeiro texto (apesar da divergência com relação à responsabilidade coletiva). Muita gente só lê a primeira crítica de Malatesta "Um Projeto de Organização Anarquista" de 1927 e julga toda a discussão por ele. É importante que se veja todos os artigos de Malatesta no debate: "Resposta de Malatesta a Nestor Makhno" de Malatesta de 1929 e "A Propósito da "Responsabilidade Colectiva" de 1930. Podem ser lidos aqui: http://www.nestormakhno.info/portuguese/index.htm.

Ainda assim, acredito que Malatesta, em outros momentos de sua vida, defendeu a união dos anarquistas com uma proposta que se aproximaria da síntese (ao meu ver porque ele temia o desaparecimento da ideologia e por isso sustentava que aqueles que se definissem anarquistas deveriam estar juntos). Assim como em outros momentos, devendeu o "insurreicionalismo" (eventos insurreicionais que gerariam movimento de massas) que também se diferencia da estratégia do "anarquismo de massas" desta abordagem que dei acima. Ou seja, Malatesta, durante a vida, adaptou e reviu esta estratégia - o que é normal, pois ele tentava adaptá-la à conjuntura. No entanto, acho que esta que coloquei é a que me parece mais interessante e coerente.

Finalmente, se tivéssemos que posicionar Malatesta entre a síntese ou a plataforma, eu acredito que ele tenha muito mais similaridades com a Plataforma (ainda que, como disse, não seja a mesma coisa) do que com a síntese. Isso eu tentei colocar nos argumentos deste texto. Por exemplo:
- Anarquismo como ideologia de transformação social apontando para um projeto finalista (de socialismo e liberdade) a ser alcançado pela revolução social violenta. (Similaridade com proposta da Plataforma). Na síntese, o anarquismo pode ser qualquer coisa, ser revolucionário ou não, defender revolução social ou não, defender a violência ou o pacifismo.
- A transformação da sociedade não se dá pela evolução, mas pela vontade do povo que, mobilizado, pode promovê-la. (Similaridade com proposta da Plataforma). Na sínetse a concepção "evolucionista" é aceita.
- Necessidade de organização com objetivo determinado. (Similaridade com proposta da Plataforma). Na síntese, militantes antiorganização e individualistas são aceitos.
- Diferenciação entre organização política revolucionária (partido) e movimentos populares (massas). (Similaridade com proposta da Plataforma). Na síntese, outras propostas como trabalhar um nível só (anarco-sindicalismo) ou não apoiar esta diferença de níveis são aceitas.
- Relação antiautoritária entre esses dois níveis de atuação (partido e massas). (Similaridade com proposta da Plataforma).
- Não ideologizar os movimentos populares, fazendo com que lutem por melhorias imediatas e que isso possa apontar para uma luta de longo prazo (revolucionária). (Similaridade com proposta da Plataforma). Na síntese são aceitas posições que ideologizam movimentos populares (anarco-sindicalismo, em que os militantes do nível de massas devem ser anarquistas) e também propostas que acham que as lutas de curto prazo são reformistas.
- Posicionamento contrário às mudanças por meio do Estado (revolucionárias ou reformistas). (Similaridade com proposta da Plataforma).

Obviamente que não há tanta similaridade em relação ao formato da organização política (ponto positivo da Plataforma ao meu ver). Ainda assim, há que levar em conta que o modelo da Plataforma foi concebido para uma situação revolucionária, com um movimento popular em efervecência e por isso a necessidade de uma organização com bases bastante rígidas. Em outros momentos, ao meu ver, isso pode ser flexibilizado (como propôs Malatesta), de acordo com a conjuntura e as necessidades do nível social (movimentos populares).

author by Carlospublication date Sun Nov 22, 2009 09:38author address author phone Report this post to the editors

Muito obrigado pela atenção e a resposta educada.

se o entendi você tenta a aproximação entre Malatesta e a Plataforma por seus pontos em comum. Mas você também reconhece que em diferentes períodos Malatesta adotou outros métodos e sua concepção se aproximou da Síntese, isso por motivos que você assinalou como as mudanças de conjuntura e o "medo" de desapareimento da ideologia.

Acredito que a tradução tendenciosa de Volin possa ter afetado o entendimento da Plataforma, mas não acredito que a base da discordância venha de uma tradução, mas do princípio da responsabilidade coletiva, no caso específico de Malatesta, pois outros iriam discordar também dos pontos sobre a Defesa da Revolução e da própria concepção de classe do anarquismo.

O que quero dizer é que também é importante ressaltar as diferenças entre eles, não somente as semelhanças, só assim poderemos ter uma noção histórica correta do debate político entre as concepções de Malatesta e Makhno e quais seus desdobramentos para a militância anarquista da época e de hoje.

Quanto a FAU, fico no aguardo de uma possível publicação de sua entrevista com Mechoso, mas reluto em acreditar que as bases "malatestianas" usadas pela FAU para sua eleboração teórica e prática tenham origem nos "momentos sintetistas de Malatesta". Acredito que elas provenham da parte do pensamento de Malatesta que era próxima a de Bakunin. Imagine a OPR-33 funcionando sem a responsabilidade coletiva ou a subordinação as diretrizes políticas globais da FAU!

Sua resposta traz elementos interessantes para o debate. Caberia a conjuntura o papel de determinar o modelo de organização anarquista, no sentindo de que poderíamos ir de um modelo plataformista para um sintetista dependendo do momento histórico? Acredito que a conjuntura influa por exemplo na adoção ou não de uma linha militar da organização anarquista, que ela influa no momento em que essa linha deva "entrar em ação", deixando claro que a elaboração de uma linha militar é algo bastante anterior a formação de uma conjuntura de guerra civil por exemplo. Acho um retrocesso para o anarquismo passar de um modelo plataformista para um sintetista por causa de mudanças conjunturais, como parece ter feito Malatesta.

Em que pontos você acha que a Plataforma possui "bases bastante rígidas" ? Sabemos que ela foi elaborada tendo em vista o fracasso do anarquismo na Revolução Russa, mas era do interesse de seus criadores que ela servisse para a imediata reorganização do "movimento anarquista", como prova a realização da conferência internacional realizada no cinema Les Roses em Paris em 1927. Não podemos cair no erro de compreender a Plataforma como sendo apenas o fruto de um contexto histórico de estágio avançado da luta de classes via guerra civil, seus princípios foram pensados para o uso imediato como forma de reorganizar o anarquismo.

Agradeço a atenção, no momento são essas minhas interrogações, caso tenha me esquecido de mais alguma gostaria de continuar o debate.
valeu.

 

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