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Nossa luta é global e por isso necessitamos maior intercâmbio

category internacional | movimento anarquista | entrevista author Friday December 15, 2006 03:00author by ANA - ANA Report this post to the editors

Em entrevista à ANA, Paddy Rua, militante da WSM (Movimento de Solidariedade dos Trabalhadores) da Irlanda, fala dessa organização e um pouco do anarquismo nesse país
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Agência de Notícias Anarquistas > Fale algo sobre a historia da WSM (Movimento de Solidariedade dos Trabalhadores)...

Paddy Rua < Na Irlanda não há uma tradição histórica anarquista, só alguns indivíduos que contribuíram com o movimento localmente e em outros países, como John Creaghe na Argentina. Nos anos 70, alguns jovens trabalhadores na Irlanda, que haviam estado envolvidos no movimento anarquista na Inglaterra, voltaram a este país e formaram grupos locais em diversas cidades. Estes grupos não prosperaram, porque tudo o que tinham em comum era a auto-definição de anarquistas. Nos anos 80, especificamente em 1984, o WSM se formou com anarquistas que viram a necessidade de uma visão e de uma prática comum. Também viram a necessidade de se envolverem no movimento sindical, assim como em outras organizações populares. Desde então nossa organização tem sido capaz de entregar uma visão e uma prática libertária respeitando as distintas lutas e acontecimentos que tem ocorrido na Irlanda. Temos sido capazes, graças à organização, de ter mais influência que a sincera soma de nossos militantes.

ANA > Vocês mantém núcleos em toda Irlanda?

Paddy < Sim, temos contatos em vários lugares da Irlanda, porém nossos núcleos militantes se concentram em Cork e Dublin, as duas principais cidades do país, com presença orgânica em Derry, e no norte.

ANA > Qual o perfil dos militantes da WSM? Gente jovem? Trabalhadores e estudantes? Há equilíbrio entre o número de homens e mulheres na organização?

Paddy < O perfil tem mudado bastante nos últimos anos. Anteriormente, o perfil de nossos militantes era primordialmente de gente de trinta e poucos anos em média, mas ultimamente, muita gente jovem tem se unido à organização, o que tem trazido bastante sangue e idéias novas, assim como tem mudado bastante a média de idade. Isto tem levado a uma mudança na presença da organização. Até um par de anos atrás todos na organização eram trabalhadores; hoje, um número significativo de companheiros são estudantes.

Com respeito ao equilíbrio entre o número de homens e mulheres, devemos reconhecer que, como em grande parte do movimento libertário, a balança não está muito equilibrada. O número de mulheres é bastante reduzido. Não acreditamos que haja respostas fáceis do por que esta situação ocorre, mas é um fato objetivo, e tratamos continuamente de ver formas de superá-lo.

ANA > E quais as principais lutas da WSM hoje?

Paddy < Bom, antes de tudo, há que se esclarecer que o nível de lutas sociais na Irlanda foi durante a maior parte do século XX bastante baixo, ao contrário do que se possa acreditar desde fora. Quase todo o conflito social na Irlanda se circunscrevia ao norte, ainda que na República as águas estavam bastante tranqüilas. Ainda assim, este conflito se restringia a questão da ocupação britânica e a libertação nacional, questões legítimas frente as quais a WSM sempre teve uma posição clara, mas se ignorava que atrás dessa ocupação imperialista, estava o domínio da classe capitalista em ambos lado da fronteira. Desafortunadamente, estas lutas anti-imperialistas e o movimento republicano que as capitalizava, dissociava na pratica esta luta do conflito de classes e da necessidade de realizar transformações de fundo da sociedade capitalista -um objetivo de muito maior alcance que a simples independência. Assim sendo, ainda que no discurso, o movimento republicano se proclama socialista.

Esta realidade, historicamente, tem constrangido ao movimento popular, tem limitado o crescimento da esquerda em geral, a qual não é senão um segmento mínimo na gama política da Irlanda, e tem significado que fora os seis condados ainda sob ocupação britânica, o nível das lutas sociais seja baixíssimo.

Isto, também tem significado que haja um espaço menor de intervenção política para os movimentos revolucionários, também nos tem dado uma maior visibilidade em nossas ações e em nossas lutas, assim como nos tem forçado a propor nós mesmos certos temas, em ausência de um movimento mais amplo que os proponha.

Nos últimos anos, as grandes lutas que a organização tem levado adiante tem sido as lutas no plano do anti-militarismo -recordemos que o aeroporto de Shannon tem sido sistematicamente utilizado pelos aviões norte-americanos como escala em sua guerra contra o terrorismo; as lutas a favor dos direitos dos imigrantes e contra o racismo; as lutas a favor de que se reconheçam os direitos abortivos para as mulheres; e hoje em dia, a grande luta na Irlanda é contra as petrolíferas no oeste da ilha, em Rossport, aonde estão ameaçando a comunidade local que se opõe ao desenvolvimento da indústria petroleira em sua localidade.

Além destas campanhas, temos estado crescentemente preocupados em levantar trabalhos mais sólidos no movimento sindical e nas comunidades populares.

Recentemente, alguns casos de violência policial nos bairros populares que tem resultado em mortes de jovens, têm aberto possibilidade de construir laços mais estáveis nesses espaços.

Da mesma forma, a intenção de colocar impostos sobre a água e a coleta de lixo, geraram alguns incipientes e esporádicos núcleos de organização barrial. Mas a ausência de tradições organizativas e de luta recentes faz com que este último trabalho, seja bastante lento e dificultoso.

ANA > E estas lutas estão fazendo a WSM crescer?

Paddy < Certamente, com estas lutas temos conseguido crescer em números, e o crescimento nos últimos dois anos tem sido maiores que tudo o que a organização cresceu desde sua fundação em 1984. De qualquer maneira, queremos chegar a muito mais gente e para isto, cremos que como passo prévio, necessitamos ser capazes de atrair os mais amplos setores da população a luta. Este é um desafio importante, mas acreditamos que temos as possibilidades de ser um fator de muito maior peso nas lutas sociais.

ANA > Vocês editam algum jornal?

Paddy < Sim, temos tanto uma revista bimestral, chamada Workers Solidarity, onde cobre certas noticias e certos conceitos políticos muito básicos, e são distribuídas gratuitamente 6.000 cópias, assim como uma revista teórica chamada Red & Black Revolution, que é edita duas vezes por ano e da que se vende 1.000 exemplares. Ainda em R&B temos uma discussão política e teórica que está mais orientada ao mundo anarquista, a orientação da WS é notadamente ao público em geral.

Ultimamente, estamos pondo muito mais ênfases de nossa presença na internet, pois sobretudo na Irlanda, setores cada vez majoritários da população têm acesso regular a este meio e simplifica muitíssimo a capacidade de ter posicionamento e opinião de forma mais direta. Trabalhamos muito no Indymedia Irlanda, com quem temos excelentes relações, e também trabalhamos muito no portal www.anarkismo.net, que aglutina diversos grupos anarco-comunistas e plataformistas, de diferentes países, incluídos Brasil, Chile, Peru, Itália, África do Sul, Turquia etc.

Além disso, estamos depositando cada vez mais esforços em nosso próprio sítio na internet, que pode ser visitado em www.wsm.ie.

À parte, temos publicado o primeiro número de um boletim em castelhano chamado Liberación, que esperamos sirva para facilitar o acesso às nossas lutas e opiniões aos companheiros de língua espanhola no mundo. Sua publicação será principalmente através da internet, de onde poderá ser baixado em formato PFD.

ANA > E possuem espaços, sedes?

Paddy < Sim, bom, possuímos uma repartição no qual temos nosso serviço de livraria, bibliotecas, e é o espaço no qual podemos ser contatados e aonde realizamos nossas reuniões. Além disso, existe um centro social libertário chamado Seomra Spraoi, o qual é autônomo e não é da WSM, mas no qual também realizamos atividades e aonde participam ativamente alguns de nossos membros.

Acreditamos que a presença de ambos espaços têm possibilitado um desenvolvimento enorme de nosso trabajo político e da presença, não só do WSM, senão que do movimento libertário mais amplo que participa em diversas lutas sociais.

ANA > E no geral como anda o movimento anarquista na Irlanda. Há outras iniciativas libertárias a se destacar?

Paddy < Na Irlanda existe um crescente movimento libertário de diversas sensibilidades, mas aparte da WSM, não há nada muito orgânico. Em Belfast existe um grupo chamado Organise vinculado a AIT que existe desde meados dos anos 80, e recentemente se formou um grupo anarco-feminista chamado RAG em Dublin. Cremos que sua presença é um grande aporte ao movimento libertário deste país, sobretudo considerando que a Irlanda tem tido tradicionalmente uma grande influência da Igreja Católica mais tradicional, o que significa que seja um país, até tempos muito recentes, bastante conservador. O anarco-feminismo, certamente, têm muito o que dizer sobre isto e acreditamos que trará uma luz fresca sobre o conjunto do movimento revolucionário para a liberação.

Existe também na República um grupo chamado Anarchist Youth, onde foi formado recentemente e tem o mérito de agrupar diversos jovens de sensibilidade libertária. Cabe mencionar que tanto com a AY como com a RAG existem boas relações e esperamos poder desenvolver trabalhos conjuntos no futuro.

Vemos o surgimento destes dois novos grupos como parte de um crescente movimento libertário, o qual é, em todo caso, um fato sumamente positivo.

Até há pouco tempo existiu uma rede ampla libertária chamada Grassroots Gathering, que se formou principalmente na luta contra a guerra de Bush, e bom, seguiu desenvolvendo um par de iniciativas, mas como todo este tipo de redes amplas, se esgotou depois de alguns anos. O positivo, é que muita dessa gente, a maioria, segue ativa em diversas iniciativas locais, assim como nos grupos como WSM e RAG.

ANA > Vocês participaram da última Feira do Livro Anarquista em Londres. Conte-nos um pouco como foi essa edição. Essa é a maior Feira editorial da Europa, certo? Outra coisa, li uma nota dizendo que um grupo “anarco-capitalista” foi expulso da Feira, o que passou?

Paddy < Este ano cerca de 3.000 pessoas visitaram a feira, não só para comprar livros e folhetos, senão também para participar das discussões e palestras. Sim, provavelmente é a maior feira desta natureza na Europa. O incidente com os anarco-capitalistas foi um assunto muito menor, pois um pequeno grupo chegou sem permissão dos organizadores, instalou seu stand e pouco depois lhes foi pedido que se retirassem. O proclamado anarco-capitalismo é uma tendência diminuta na Europa, não mais que meio punhado de pessoas, que se associam na realidade com políticas conservadoras.

ANA > E há alguma Feira na Irlanda? Algum evento “grande”?

Paddy < Bom, desde o ano passado, ante o crescente movimento libertário na Irlanda, vimos à necessidade de começar a realizar anualmente, em março, uma Feria do Livro Anarquista na Irlanda, que este ano foi um grande êxito. Esperamos que no próximo ano seja igual. Creio que essa é a atividade mais "grande", mas regularmente se realizam outras classes de atividades, tanto por parte da organização, da AY e da RAG, assim como por parte de iniciativas particulares.

ANA > No Reino Unido há alguma tentativa de coordenar federativamente os diversos grupos?

Paddy < No Reino Unido existem três federações nacionais, a AF, a Solfed, que está aderida a AIT, e a Class War. Separada, existe a IWW, que se não é anarquista, agrupa bastantes libertários e é a maior organização de todas elas. Todas estas federações têm já vários anos de existência.

ANA > Diferentemente de outros lugares, de longe sinto que o tema “ecologia”, a luta ambientalista está muito presente no universo anarquista no Reino Unido. Concorda ou estou equivocado?

Paddy < Bom, nós somos uma organização irlandesa, assim que não sei se nos corresponderia realmente falar com absoluta propriedade da situação no Reino Unido, mas parece ser uma preocupação importante no movimento libertário nessas terras.

ANA > Gostaria de acrescentar algo mais? Obrigado e ânimo na luta!

Paddy < Bom, nada além de estabelecer nosso ânimo de trocar opiniões e experiências com os libertários em luta na América do Sul. Cremos que há coisas muito importantes e desenvolvimento que nos enchem de otimismo no hemisfério sul, especialmente, no que se refere ao movimento anarco-comunista. Nossa luta é global e por isso necessitamos maior intercâmbio. Agradecemos muita a entrevista.

Secretaria Internacional da WSM: wsm_ireland@yahoo.com

WSM: www.wsm.ie

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