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Protesto social recebe tratamento militar na Colômbia

category venezuela / colombia | repressão / prisioneiros | opinião / análise author Wednesday August 28, 2013 21:31author by José Antonio Gutiérrez D. Report this post to the editors

Colômbia Resiste

O governo nacional colombiano sempre diz que respeita o direito ao protesto social. Porém, a Paralisação Nacional Agrária e Popular, convocada desde o dia 19 de agosto pelas principais organizações camponesas do país junto com setores como transportadores, trabalhadores da saúde e mineiros, tem recebido um tratamento militar por parte das autoridades, que já violentaram todo tipo de direitos dos manifestantes. Uma situação particularmente grave está acontecendo no departamento do Cauca, aonde os dois pontos de concentração ao norte e ao sul do departamento enfrentam um cerco militar no qual o exército e a força pública dão mostras da sua interpretação da doutrina do “inimigo interno”. Nesses dois locais, em El Cairo (Cajibío) e em El Pilón (Bordo-Patía) os camponeses estão sendo cercados militarmente em quanto são agredidos e seus barracos são queimados, os soldados roubam os alimentos e derramam a água. [Castellano]
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Protesto social recebe tratamento militar na Colômbia

Grave situação humanitária no departamento do Cauca


O governo nacional colombiano sempre diz que respeita o direito ao protesto social. Porém, a Paralisação Nacional Agrária e Popular, convocada desde o dia 19 de agosto pelas principais organizações camponesas do país junto com setores como transportadores, trabalhadores da saúde e mineiros, tem recebido um tratamento militar por parte das autoridades, que já violentaram todo tipo de direitos dos manifestantes. Aliás, o protesto social não recebeu somente um tratamento militar: o tratamento recebido é próprio de uma situação de guerra irregular. Caveirões, helicópteros e aviões de combate, desembarco de tropa, fuzis, balas de borracha, bombas de “efeito moral”, gases, bombas artesanais com metralha... esse é o arsenal que já enfrentaram os camponeses desarmados. Camponeses que tem saído a se manifestar,pressionados pela fome e pelas necessidades básicas insatisfeitas, muitas vezes acompanhados pelas suas famílias. Nos departamentos de Cauca, Meta e Hulia o governo chegou mesmo a oferecer 10 milhões de pesos colombianos pela informação que permita identificar aos líderes da paralisação, utilizando mecanismos próprios da guerra contrainsurgente.

Oscar Salazar, dirigente do processo camponês de La Vega no departamento do Cauca e um dos porta-vozes da Mesa Nacional Agropecuária e Popular de Interlocução e Acordo (MIA), um dos principais organizadores da paralisação, explica o panorama repressivo que vigora no nível nacional:

Há uma absoluta violação dos Direitos Humanos; estamos diante de formas desproporcionadas, absurdas, e até mesmo criminosas, de violência em contra de aqueles que manifestam seu legitimo direito ao protesto (...) o exército joga bombas de “efeito moral” desde os helicópteros. É muito duro, tropas do exército, que atiram indiscriminadamente... há uma menina que foi vítima dessas agressões, um projétil de fuzil atravessou o abdômen dela; isso cá em Cundinamarca... estão sendo utilizadas armas não convencionais, espingardas carregadas com metralha para agredir aos manifestantes... a violência é totalmente desproporcionada...”.

Guerra suja contra os camponeses no Cauca: Casos em El Cairo e Galindez

Uma situação particularmente grave está acontecendo no departamento do Cauca, aonde os dois pontos de concentração ao norte e ao sul do departamento enfrentam um cerco militar no qual o exército e a força pública dão mostras da sua interpretação da doutrina do “inimigo interno”. Nesses dois locais, em El Cairo (Cajibío) e em El Pilón (Bordo-Patía) os camponeses estão sendo cercados militarmente em quanto são agredidos e seus barracos são queimados, os soldados roubam os alimentos e derramam a água. Segundo explica Lizeth Montero, da Red de Derechos Humanos del Suroccidente Colombiano “Francisco Isaías Cifuentes”, a situação é ainda mais grave do que tratamento militar, porque estão sendo violados princípios básicos que devem vigorar mesmo em tempos de guerra, por exemplo está se negando a possibilidade de “corredores humanitários e a garantia de condições mínimas de vida para as pessoas. Está se fazendo com que elas passem fome e está se impedindo o acesso ao atendimento médico... No local chamado El Cairo a gente teve até um ataque contra uma missão médica, porque o ESMAD (tropa de choque) não permitiu que os feridos fossem retirados”. Nessa ocasião, segundo um comunicado dessa rede, uma missão humanitária composta por membros da Defensoría del Pueblo foram atacados pelo ESMAD e o exército com bombas de “efeito moral”.

No local El Cairo (Cajibío) estão congregados entorno de 2000 camponeses que estão sendo agredidos por cerca de 600 homens de forças combinadas do Exército nacional, Polícia Nacional, Polícia Militar, ESMAD e 10 caveirões. Isso, além dos sobrevôos constantes e dos ataques desde os helicópteros. A gente conseguiu falar com um dos dirigentes dos camponeses que estão cercados e o depoimento dele é dramático:

Temos aproximadamente 10.000 pessoas se mobilizando no Cauca, uns deles no sul do departamento, outros no norte... estamos sofrendo neste momento um cerco militar. A Defensoría del Pueblo fez presença, mas a força pública não permite ela se reunir conosco; ameaçam a gente com capturas, temos 2000 camponeses nessa situação de inquietação. No sul temos uns 7000 camponeses num buraco enquanto a força pública avança tanto no sul como no norte, impedindo nosso fornecimento de alimentos. É uma situação muito grave”.

A situação é tão grave que o governo chegou inclusive a processar a dois camponeses feridos: Juan Pablo Bueno e o idoso Eusebio Ulcué, feridos durante a repressão do dia 20 de agosto em El Cairo. Sobre esse assunto explica Lizeth Montero que

nesses momentos há um ferido por arma de fogo, Andrés Guachetá foi ferido no pé. Também há outros 5 feridos a causa do uso de gases e armas não convencionais, granadas com grampos, e outras armas que estão sendo jogadas contra a população camponesa. Também há 4 detidos, dentre eles um menor de idade chamado Carlos Andrés Giraldo do município de Corinto, que não sabemos aonde foi levado... ele está sumido e isso é uma situação muito angustiante”.

Os camponeses não hesitam em acusar aos oficiais Julio Pinzón Arévalo, comandante da XXIX Brigada do Exército e a Ricardo Alarcón Campos, comandante da Polícia no departamento doCauca, como os responsáveis direitos dessas agressões e abusos.

No ponto de concentração no sur, no local El Pilón (Galindez-Patía), também foram reportados ataques aos manifestantes com fuzis, bombas “de efeito moral”, armas de fragmentação e balas de borracha por parte do ESMAD e do Batalhão de Alta Montanha N° IV “General Benjamin Herrera Cortez” do Exército Nacional. Como consequência dessas agressões foram gravemente feridos: Eiver Bolaños, atingido por um tiro no pé; Diógenes Enriquez, ferido no pescoço; Nestor Timaná, ferido no crânio, pescoço e um braço; Marino Díaz, ferido na perna e Apolinar Montero, ferido nas costas. Também há 22 pessoas detidas no sul do Cauca e um número ainda não determinado de pessoas agredidas fisicamente pela força pública. Segundo Lizeth Montero: “Não há garantias para o protesto em nenhum dos locais de concentração no departamento”.

A pesar de que é utilizada uma violência desmedida com métodos terroristas por parte das forças do Estado, a legitimidade dos camponeses lhes da a coragem e a decisão para continuar na luta. “Os camponeses estão recuados nesses momentos”, comenta o dirigente camponês de El Cairo, “estão em assembleia tomando decisões; a gente está animada e tem força porque as nossas demandas são justas. Vamos continuar a mobilização, mas estamos cercados militarmente, então temos que ponderar a correlação de forças e buscar o jeito de continuar”.

Unidade Nacional do movimento: garantia para a vitória

Montero ratifica a resolução dos camponeses: “A decisão deles é continuar na paralisação até que sejam atingidos os resultados esperados no nível nacional... As pessoas continuam com a firme decisão de participar no protesto, a pesar da repressão estamos trabalhando pela unidade ao nível das coordenadorias nacionais para que aumente a participação. Há perspectivas positivas para os dias que vêm”.

Esse é o fator chave: No meio das demandas regionais e departamentais, e das dinâmicas locais de cada processo, é preciso focar numa luta nacional que deve se fazer de maneira unitária e sem mesquinhez, que é precisamente o que o governo nacional tem tentado semear no movimento com o objetivo de dividir e reduzir o protesto à impotência. Oscar Salazar fala do tema:

O governo está utilizando a tática de negociar só com alguns grupos faz varias semanas, para sair fortalecido utilizando aos movimentos que buscam benefícios particulares em vez de mostrar a unidade do conjunto... o governo oferece sinecuras e desse jeito coopta as organizações... a mesma isca foi oferecida para nós, mas nós dissemos não, dissemos que isso é um problema de todos, que temos uma Mesa Nacional para negociar o conflito e assim é que devemos de atuar. Temos um documento nacional de demandas, temos um espaço de coordenação com os outros processos nessa mobilização nacional. Esperamos desse jeito podermos coordenar ações e esperamos que todos os processos fortaleçam suas ações para negociar com o governo nacional”.

O protesto continúa a pesar da violência oficial da qual temos sido testemunhas em Boyacá, Cundinamarca, Valle del Cauca, Nordeste Antioqueño, Cauca, etc, assim como do cerco mediático por parte da grande mídia.

A repressão tem sido brutal, mas aqui estamos. Há 24 departamentos que atenderam o chamado no marco da Paralisação Nacional Agrária e Popular... nós, como MIA, atuamos em 17 departamentos, com cerca de 50 locais de concentração em todo o país, já alcançamos 12 locais de bloqueios sozinhos, mas mantemos somente 6 permanentes porque a repressão tem sido brutal”.

Em total somando todas as expressões que convocam a essa paralisação (incluindo caminhoneiros e ao Coordenador Nacional Agrário, dentre outros), segundo a polícia, são mantidos 18 bloqueios em 8 departamentos. Segundo dados oficiais da polícia se trataria de 30.000 manifestantes, mas em total o número de pessoas que participariam da paralisação, segundo a imprensa oficial, poderia aumentar a 200.000 pessoas [1], quantidade que ainda não se manifestou simultaneamente devido à violenta repressão que mantém dispersos aos grupos.

A violenta resposta do Estado à pacífica mobilização social põe em questão as credenciais democráticas que o governo colombiano presume, particularmente no contexto das negociações de um acordo de paz com a insurgência. Salazar fala enfaticamente ao final da nossa conversa: “A injustiça social é a causa dessa violência toda na Colômbia, porque os camponeses protestam com suas mãos vazias... as políticas do governo são violentas e injustas. Não há por enquanto qualquer vontade de diálogo”.

É preciso juntar mãos e esforços, apoiar essa paralisação, não ceder ao medo nem à violência do Estado, materializar a indignação em ações solidárias concretas. Viva a Paralisação Agrária e Popular!

José Antonio Gutiérrez D.
21 de Agosto, 2013

* Para informações atualizadas sobre a situação no Cauca e no Sudoeste Colômbia, revisar o site da rede “Francisco Isaías Cifuentes” http://www.reddhfic.org

Fonte: Marcha Patriótica - Capítulo Brasil


[1] http://www.semana.com/nacion/articulo/hay-18-bloqueos-4...760-3

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