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Entrevista com um anarquista do Zimbábue

category África austral | movimento anarquista | entrevista author Friday October 02, 2009 23:05author by Jon - Zabalaza Anarchist Communist Frontauthor email zacf at zabalaza dot net Report this post to the editors

Um membro da Zabalaza Anarchist Communist Front esteve com Biko, militante comunista libertário da rede Uhuru Network do Zimbábue, em 10 de agosto passado, quando ele estava em Johanesburgo, na África do Sul, para assistir ao evento anual da Khanya College Winter School.

Nesta entrevista, Biko fala sobre as mudanças no campo social, político e econômico desde que o Governo de Unidade Nacional (GUN) começou sua caminhada; a situação dos movimentos sindical e estudantil; a eliminação dos gays e das lésbicas; os processos de reforma constitucional e as esperadas campanhas de violência de Zanu-PF diante das próximas eleições.

[Castellano] [Italiano] [English]

Pergunta > Poderias nos dizer como tem se modificado o panorama político, social e econômico desde que apareceu o Governo de Unidade Nacional (GUN)?

Biko < Inicialmente é necessário mencionar que está existindo um pouco de abertura do espaço democrático em termos de articulação popular, mas em termos sócio-econômicos a situação têm piorado, particularmente com a dolarização da economia. Ela teve um impacto muito mais negativo nas comunidades rurais e, com especial atenção nas comunidades urbanas, dado que 85% dos zimbabuanos estão desempregados, muita gente tem problemas para ter acesso aos dólares Made in USA.

Pergunta > Como tem reagido às pessoas em relação à entrada do MDC no governo, e em que condições estão suas estruturas?

Biko < A entrada do Movimento pela Mudança Democrática (MDC, siglas em inglês) no que, preferimos chamar, governo de transição - mas que chamam governo de unidade nacional - é visto por muita gente do movimento pró-democracia como uma traição porque não ouve consultas visando esta entrada. É parte de um pacto elitista impulsionado por Thabo Mbeki (presidente da África do Sul). Nos primeiros três meses do GUN têm sido visto a Robert Mugabe desafiar abertamente o próprio acordo do GUN, acrescentando cinco ministros mais, recusando reconhecer certos ministérios que tinha feito um acordo com a direção do MDC. Assim, é amplamente visto como uma ação traiçoeira.

Pergunta > Quais desafios e oportunidades oferecem esta situação a Uhuru Network e a outros movimentos sociais?

Biko < Há agora uma clara desilusão entre os militantes de base do Movimento pela Mudança Democrática, e os ativistas comunitários são mais propensos a trabalhar com os grupos radicais que têm atacado sempre aos partidos políticos do Zimbábue.

Pergunta > Em que estado se encontram os sindicatos da Zimbabwean Congress of Trade Unions, no contexto de um desemprego massivo e distribuição do poder?

Biko < As bases do Zimbabwean Congress of Trade Unions se debilitaram ao fundirem-se a indústria no Zimbábue. Já não há um movimento que seja fundamentado em uma massa de trabalhadores no Zimbábue. Os líderes têm tomado caminhos radicais, ao decidir não se implicarem no processo de reformas constitucionais estipulados pelo acordo do GPA que guia ao Governo de Unidade Nacional. Sem dúvida até que momento serão capazes de seguir mediante as ameaças de uma greve geral, como tem insinuado no mês passado, é duvidoso devido a que sua base social de massas está debilitada.

Pergunta > Como se encontra o movimento estudantil neste contexto?

Biko < Os líderes da Zimbabwe National Students’ Union também se uniram a Assembléia Nacional Constituinte e ao Zimbabwean Congress of Trade Unions em uma campanha contra qualquer projeto de constituição que saia do processo de reformas constitucionais feito pelo GPA. A Universidade do Zimbábue permanece fechada como resultado do estado de pânico ante a mobilização dos estudantes e as suas ações, mas há uma base radical entre os estudantes dado que outros institutos e faculdades estão abertos e tem realizado uma campanha contra a privatização da educação, que está sendo seguida até pelo MDC e o governo ZANU-PF.

Pergunta > Podes falar sobre as distintas posições que tem sido tomada em relação ao processo de reforma constitucional, como a rede Uhuru Network o enfrenta ou, e, em que perspectivas isto pode afetar o futuro?

Biko < No movimento pró-democracia no Zimbábue há basicamente três posições. Uma que é a que tem tomado a Assembléia Nacional Constituinte, o Zimbabwean Congress of Trade Unions e a Zimbabwe National Students’ Union, que é uma posição de não aceitação e de campanhas contra o próprio processo. A segunda posição é a que tem sido tomada pela maioria de ONGs e organizações da sociedade civil, organizadas em particular sob a Crisis Coalition e a Organização Nacional de ONG, estas organizações têm assumido que o processo está viciado, mas que ante uma onda de protestos se conectarão com os processos consultivos governamentais e inclusive buscarão ser parte das comissões e das estruturas deste processo.

Uhuru Network tem decidido ficar a margem das estruturas da comissão, porque acreditamos que nos daríamos uma falsa esperança de que estes processos governamentais possam oferecer um caminho de liberdade para a população, opinião que não compartimos. Assim temos decidido continuar expondo as falhas no processo fazendo campanha contra ele, nas reuniões consultivas que temos tido nas comunidades ante o referendum. Esta é nossa posição que está particularmente fundamentada pelo fato de que: quando saia um esboço de constituição do processo e seja oferecido ao povo, o povo se dará conta que não é o que eles querem e pelo que tem lutado. Acreditamos que é o momento de fazer campanha contra este esboço e é daí onde buscamos tirar energia.

Pergunta > Podes nos dizer algo sobre a estrutura e as atividades da Uhuru Network, sobre seus aspectos culturais e como se combinam estes com a política?

Biko < Uhuru Network na atualidade está composta de dois coletivos, Alternative Media Collective e Toyi Toyi Artz Kollektive. Entre estes dois coletivos temos artistas e ativistas dos meios de comunicação que estão envolvidos nas comunidades. Trabalhamos em cinco comunidades ao redor de Harare (a capital do país); Chitungwiza, Glen Norah, Glen View, Highfields e Waterfalls. Temos aproximadamente 20 membros nestas comunidades, e nosso maior programa político nestas comunidades são os círculos de estudo. Assim temos os artistas e os ativistas de comunicação se envolvem nestes círculos de estudo onde construímos a política da organização.

Com respeito a nosso componente cultural, isto tem surgido particularmente devido as dificuldades nas quais trabalhamos e a repressão da liberdade de expressão. E percebemos que nossos companheiros encontram mais facilidade em expressar-se mediante a poesia e a música e outras formas artísticas, e que estas formas são utilizadas para interagir com as comunidades.

Pergunta > Como vocês lidam com os temas de gênero na rede; há um equilíbrio de gênero e existe uma cota de gênero?

Biko < Nos últimos cinco anos nossa rede esteve dominada por companheiros homens e durante o ano passado decidimos que ao reconstituir nossos círculos comunitários impulsionaríamos uma cota de 50%. Assim, agora, temos em cada comunidade um equilíbrio. Esta decisão sofreu alguma resistência por parte de alguns membros da organização, mas nos últimos dois meses acreditamos que esta política foi compreendida.

Pergunta > Qual é vossa relação com a Women of Zimbabwe Arise?

Biko < Acreditamos que Women of Zimbabwe Arise! (Mulheres do Zimbábue Levantem-se!) é provavelmente a organização de ação direta comunitária mais forte. Temos visto também sua atuação focando temas de justiça social e econômica, estamos de acordo com suas campanhas, e que uma organização no Zimbabwe tenha que estar nas ruas, e por isso colaboramos em diálogos e programas de ação direta com elas.

Pergunta > Qual é o clima de homofobia no Zimbábue; é permitida a organização dos gays, lésbicas, bissexuais e os trans, para defender seus direitos? É forte a perseguição? Como lidam com estas lutas?

Biko < As manipulações que Robert Gabriel Mugabe fez contra os gays e as lésbicas no Zimbabwe há quase dois anos levou a que as forças repressivas ponham mais e mais repressão aos gays e as lésbicas, em particular contra sua organização, Gays and Lesbians of Zimbabwe. Acreditamos que há poucos ou nenhum espaço aberto para eles e elas atualmente, porque na sociedade zimbabuense há também estigmas contra os gays e as lésbicas, que emanam das tradições conservadoras. Temos tentando forjar vínculos com Gays and Lesbians of Zimbabwe, mas a situação é tão repressiva que não conseguimos avançar em nada sobre tudo isto. [Nota: Biko disse mais tarde que não era que não tivesse saído nada de suas tentativas de fazer vínculos com GLZ, se não que estas tentativas haviam sido frustradas devido ao severo clima de repressão e ao alto nível de clandestinidade que os gays e as lésbicas do Zimbábue estão submetidos atualmente. Achava ainda, que necessitavam desenvolver uma confiança mútua para estabelecer vínculos práticos.]

Pergunta > E o que existe de luta das mulheres, há mais espaço de manobra neste aspecto?

Biko < Achamos que sim, devido ao interesse que tem existido do governo diante das campanhas de direitos das mulheres, em particular quando o Zanu-PF colocou uma mulher como vice presidente. Como resultado disto, vemos que é muito mais fácil, agora, advogar pelos direitos da mulher, mas até que grau as estruturas da sociedade tem sido reorganizadas para incluir as mulheres, não estamos seguros. Acreditamos que em geral o status da mulher na sociedade não tem mudado.

Pergunta > Que cenários visualizas serem prováveis para o próximo ano, e como se pode demonstrar a solidariedade internacional de forma prática?

Biko < Os processos de reforma constitucional no Zimbábue tem levado ao colapso das estruturas do MDC, e também como conseqüência das campanhas violentas que o Zanu-PF tem dirigido contra os ativistas militantes das comunidades. Como resultado acreditamos que o MDC como partido é impotente para opor-se aos planos de Zanu-PF em torno da reforma constitucional. Acreditamos que o resultado do atual processo de reforma constitucional não está dirigido para o povo e, portanto não será aceito por ele.

Há poucas entidades que estão se organizando contra este processo, e cremos que se dará uma situação polarizada quando se convoque o referendum. Com o resultado Zanu-PF voltará a realizar outra campanha sangrenta. O referendum será seguido de eleições gerais e o Zanu-PF ainda não está preparado para isto, não desmantelou o seu maquinário repressivo. Assim que provavelmente veremos mais do que vimos no ano passado com relação às eleições gerais no Zimbábue.

As prioridades do momento no Zimbábue é a de reforçar as estruturas dos movimentos e prepará-los para a autodefesa e também a de fazer alianças estratégicas que reforcem todo o movimento pró-democracia. Com relação à solidariedade internacional, achamos, que deveria ir mais na direção ao reforço destas estruturas, em particular, quem sabe, através de despertar e aprofundar a consciência política dos companheiros. E suponho que a literatura e os materiais educativos serão úteis para isto. E também, nós necessitamos permanecer conectados, em particular em solidariedade contra a repressão que prevemos para o ano que vêm.

Toyi Toyi Artz Kollektive

Tradução por Juvei
Agência de Notícias Anarquistas-ANA

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